Campo Grande (MS) – Inspirado na literatura brasileira e imerso em um universo formado pela conjunção entre ficção e realidade do ser-tão, o espetáculo “O Crivo” abre neste domingo (23) a Semana Pra Dança 2017. A apresentação acontece às 20 horas, no teatro Prosa, no Sesc Horto. A entrada é a doação de um livro.
Se Guimarães Rosa foi construtor de uma linguagem única em suas obras literárias, “O Crivo” também reflete a mesma busca por um neologismo, nesse caso, de movimentos. O criador do espetáculo, o também mineiro João Paulo Gross, transcreve para a dança as emoções e sentimentos de uma ambiência encontrada nos romances sertanejos do escritor. Sem se corromper com uma interpretação literária, o criador cuidou de elaborar uma experiência de imersão em sons, cores e texturas, que provocam os sentidos e transportam a plateia para uma nova dimensão desse ser-tão.
Ao todo serão 45 minutos de uma experiência artística sensorial. Um mergulho em sentimentos e emoções que são como o barro na formação mitológica do homem. As músicas são de Villa-Lobos, Francisco Mignoni, Rachel Grim, mas nessa obra não existe silêncio ou pausa entre as melodias. Ruídos de uma natureza interna perpassam todo o trabalho. Os corpos dos dois bailarinos então transformam passado, presente e futuro em uma travessia, que imprime no espectador aquela sensação de que só o que faz sentido na vida é o que está entre o nascer e o morrer, ou seja, a caminhada, pela qual passam todos os seres dessa terra.
Evidenciando esse tempo que corre, e esse caminho que se percorre, e refazendo um universo solar, próprio de Guimarães Rosa, Henrique Rodovalho – coreógrafo da Quasar Cia de Dança – é o responsável pela iluminação da obra. O figurino, por sua vez, fica por conta de Flora Maria, com o apoio da Anunciação.
Crivo é uma palavra de muitos sentidos. Ao falar sobre o nome de sua obra, o coreógrafo retoma tanto o trabalho artesanal do bordado, de quem faz crivos em um tecido, furando-o e marcando-o fortemente, quanto reflete também sobre o sentido de se separar o que é útil do que é banal, de se encontrar uma essência humana, fazendo tudo passar pelo crivo de uma arte, de um olhar, de uma construção entre artista e público.
Inspirado na obra “Primeiras Estórias” do escritor João Guimarães Rosa, um dos mais revolucionários e complexos da literatura brasileira do século XX, “O Crivo” leva ao palco dois intérpretes que criam relações que só se revelam à medida em que atravessam suas estórias, o SER-TÃO, o mundo de cada um, solitário, percebendo no recolhimento um mergulho na busca do que permanece, do que nos tornam diferentes e próprios.
Dança inspirada em literatura
Esta não é a primeira vez que João Paulo Gross coreografa a partir de temas da literatura. “A literatura detona em mim essa necessidade de criação. Quando fui chamado para coreografar o espetáculo ‘Terreiro’, para o Primeiro Ato Grupo de Dança de Belo Horizonte, também usei como referência poemas e textos sobre o universo mineiro. É como se eu quisesse escrever no linóleo as imagens que surgem para mim quando um livro, um poema, um conto me provocam. E esse momento de descoberta é tão intenso, que eu geralmente faço as coreografias sem músicas. Depois que tenho pronta minha própria escrita, é que busco a trilha sonora ideal”.
João Paulo Gross
Coreógrafo, bailarino, professor de movimento e Membro do Conselho Internacional de Dança – CID. Bacharel em Dança pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, formado pela Escola Angel Vianna (curso técnico em Dança Contemporânea).
Trabalhou com os coreógrafos Marisa Martín (Grupo Ribalta/RJ), Duda Maia (Trupe do Passo/RJ), Márcia Rubin/RJ, Regina Miranda/RJ, Rui Moreira/MG, Paulo Caldas/CE e Henrique Rodovalho/GO.
Coreografou os espetáculos: O.P.N.I. (objeto poético não identificado)/2006, Tudo Continua Sempre /2007, Natureza Morta/2009 que ganhou a Mostra Novíssimas Pesquisas Cênicas 2009, do CEAE – Centro de Estudo Artístico Experimental – Sesc Tijuca – Sob a coordenação de Ana Kfouri, Fica Comigo/2014 para a Quasar Jovem, O Crivo/2015 (contemplado com o Fundo de Cultura do Estado de Goiás/2014 e aprovado na Lei Municipal da Prefeitura de Goiânia/2014 com o projeto de montagem), e Sobre a Pele/2015 para o Grupo de Dança Das Los. Integrou o elenco da Quasar Cia. De Dança no período de 2010 a 2016.
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