Campo Grande (MS) – “Olha só rapaziada… Grafitti suja mesmo a mão. Não tem jeito. Mas com o tempo o artista não liga mais. Cria uma necessidade quase orgânica de pintar e é isso que eu espero que aconteça com vocês”, explica Marilena Grolli – quinze anos de bagagem pelos muros dos mais variados ambientes urbanos – a nove adolescentes internos da Unidade Educacional de Internação Dom Bosco, em Campo Grande.
Eles são a primeira turma de um curso de Grafitti pensado entre a Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul e da Defensoria Pública do Estado. As aulas, ministradas pela arte educadora e gestora cultural, seguem até sexta (8 de abril), com aulas teóricas e muita, muita prática. Até lá serão dezenas de latas de tinta, diversos quadros de estêncil (molde para pintar desenhos e ilustrações) e milhões de idéias coloridas.
A lista dos participantes foi avaliada pelo diretor da Unei, Jean Gouveia, minutos antes do curso. Alguns dos inscritos não mais estavam lá: já cumpriam medidas sócio-educativas sem restrição de liberdade. Para participar eram necessários dois requisitos: gostar da arte e ter bom comportamento. Pelo menos três adolescentes conquistaram as vagas restantes pelo último critério.
Um a um eles entram na sala de tecnologia. Cumprimentam todos, mas os olhares miram o chão. Desconfiança, medo, insegurança, não é possível saber ao certo. É preciso muito mais para que eles possam aliviar a carga que os abraça como um colete e manifestem sinais mais positivos em semblantes que refletem as durezas do mundo. Que meninos de 16 e 17 anos não deveriam ter.
Direta e franca, a professora envolve os alunos na pintura de um estêncil. E aos poucos os nove deixam a desconfiança de lado. São bons internos, que cumprem as regras como a grande maioria dos adolescentes que lá estão. E o curso é também para isso. Um sopro dentre muitos que ajudam a aproar as velas para um novo rumo.
“Não formamos aqui artistas. A rua formará os artistas se cada um aqui quiser seguir este caminho, e eu torço muito para que todos sigam. O curso é mais uma forma de abrir a mente desses adolescentes para a arte e para novas manifestações de vida”, explicou Marilena Grolli, que colocou a mão na tinta antes mesmo de iniciar as aulas teóricas. “Eu não tenho muita paciência. Acho que vocês também preferem assim, não é?”.
Defensora Pública e coordenadora do Núcleo Institucional de Promoção e Defesa da Criança e Adolescente, Auristela Machado Vidal considera o curso uma oportunidade para que os internos ganhem mais visões de vida e alimentem o desejo de conquistar novos destinos. “As aulas abrem as portas de uma nova vivência. É o que buscamos neste momento: reinserção pela educação e pela arte”.
O curso é um projeto piloto que será implementado em outras Uneis do Estado. Conta com apoio da Velutex Indústria e Comércio de Tintas, que doou grande parte das latas de spray que serão utilizadas nas aulas e de diversos representantes da sociedade civil. Já as obras criadas pelos internos integrarão uma exposição no Centro Cultural José Octávio Guizzo, unidade da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul. Todos os participantes receberão certificados de participação.