Campo Grande (MS) – O Museu da Imagem e do Som (MIS) recebe a partir da próxima segunda-feira (12) a Mostra de Cinema Marginal. Os filmes serão exibidos de segunda a quinta-feira, a partir das 19 horas, com entrada franca.
Cinema de resistência e deboche, o chamado Cinema Marginal surgiu na ressaca do Cinema Novo, como resposta possível ao cerco da Ditadura Militar e seu AI-5. Englobando variadas poéticas e propostas, seus filmes têm em comum a precariedade e a falta de meios transformadas em linguagem de urgência e transgressão artística.
Muitos de seus frutos nem chegaram a ser lançados à época ou foram sequestrados pela censura. Como numa sala de espelhos embaçados e quebrados, assisti-los hoje traz a imagem esfacelada de um Brasil que insiste em se repetir como triste farsa carnavalesca.
Confira abaixo a programação:
Segunda-feira:
A Margem (1967), de Ozualdo Candeias
Poucos diretores tiveram estreia tão ambiciosa cinematograficamente quanto Candeias em A Margem. Imagine-se: um jovem diretor aventura-se pela primeira vez num longa-metragem e seu primeiro filme tem os primeiros cinquenta minutos realizados em câmera subjetiva, ou seja, cada imagem que vemos é o olhar de um personagem diferente. Um filme sobre olhar: A Margem segue a vida de quatro personagens à beira de um rio lodoso, numa localidade miserável, que evoluem entre a vida da favela, com sua luta pela sobrevivência, e a existência no submundo paulistano.
Terça-feira:
Hitler 3º Mundo (1968), de José Agrippino de Paula
Difícil tarefa é enquadrar José Agrippino de Paula no panorama cultural brasileiro. Escreveu livros absolutamente solitários dentro da nossa literatura, propôs uma nova dramaturgia e fez um dos filmes mais inquietantes do nosso cinema: Hitler 3º Mundo.
Ensaio-delírio-pesadelo-desfuturível-distópico-contínuo-hoje, feito em caráter de urgência, no auge da repressão militar, o filme foi rodado na clandestinidade, nunca tendo sido lançado comercialmente, suas absurdas imagens e personagens, vistas hoje, são de uma atualidade aterrorizante.
Quarta-feira:
Os Monstros de Babaloo (1970), de Elyseu Visconti
Uma das obras mais debochadamente grotescas de toda a cinematografia mundial, um filme pantagruélico, que antevê John Waters, o rei do trash, diretor do infame Pink Flamingos.
Metáfora de dentes podres expostos da nossa ávida, inculta e cruel burguesia e sua tradicional família brasileira, foi proibido pela ditadura militar e certamente deixaria os atuais homens de bem e bens espumando feito cachorros loucos frente a um espelho tão fidedigno de sua feiura moral.
Quinta-feira:
Câncer (1968/1972), de Glauber Rocha
Filmado em 1968 e finalizado somente em 1972, no conjunto dos filmes experimentais e do cinema novo, Câncer é um corpo estranho. Não se harmoniza, mas também não diverge radicalmente de ambos, tal como um satélite a colher e remeter imagens, espécie de entre-safra glauberiana que gerará, pós-1975 (Claro), a “montagem nuclear” de Di (1977) e A Idade da Terra (1980). Câncer marca um dos primeiros movimentos em direção a uma nova concepção de montagem, incorporando o documentário à ficção e englobando o marginalismo como interrogação íntima do discurso cinemanovista.