Campo Grande (MS) – Quatro mulheres talentosas, sensíveis e engajadas abrilhantaram este sábado (26 de março) na Biblioteca Pública Estadual Dr. Isaias Paim: o primeiro Sábado Literário de 2022 foi um agradável e proveitoso bate-papo sobre mulheres sul-mato-grossenses que produzem literatura. Tânia Souza, Adrianna Alberti, Josiane Francisco e Diana Pilati também lançaram seus livros, que fazem parte da coleção III do Mulherio das Letras.
O livro de Tânia Souza, “Microficções e outras fantasmagorias poéticas”, era para ter saído o ano passado, foi produzido durante a pandemia. Para ela, é realmente uma teimosia escrever, uma luta. “Havia durante a pandemia a possibilidade de reflexão, de ensinamento, em outros momentos de medo, angústia, tristeza, falta de inspiração. Dá para ver isso nos meus textos. Eu escrevo sobre vários assuntos e em vários gêneros. Nós vivemos a tecnologia e nós vivemos o simples. Acabei trazendo isso, são textos cujas histórias podem se passar numa cozinha e também brincam com a imaginação, com as possibilidades, e brincam com a linguagem. São várias mensagens e várias imagens que eu procuro trazer”.
“Eu estava pensando na evocação de uma realidade que não existe. Sempre gostei do fantástico, de tentar pescar essas possibilidades no fantástico, um segundo olhar, eu gosto de uma literatura que provoque, que balance as estruturas. A gente escreve para o leitor e escreve para a gente. Você tem um objetivo quando escreve, é intencional. Eu gosto de trazer o conto tradicional e colocar um elemento futurista, é um pouco para brincar também com as palavras e com a estrutura do texto”, diz ^Tânia.
Adrianna Alberti voltou a escrever durante a pandemia. Para a escritora, as coisas pioraram com relação à saúde mental, mas ela foi mais feliz escrevendo na pandemia que em outros momentos. “Coisas boas também puderam sair desse período. As micronarrativas começaram com um convite que recebi do Coletivo Bule. Eu decidi escrever sobre o que eu tenho vivido, o que tem me inspirado, um sentimento ou situação que eu passei. Esse projeto do Coletivo foi o que deu origem às micronarrativas do livro “As Cores na Ponta da Língua”. Fiquei dois anos produzindo as micronarrativas. Nas minhas histórias, minha narradora acaba sendo sempre uma mulher, sempre acaba sendo o ponto de vista feminino”.
“Eu cresci em meio a muitas mulheres, nossas figuras de referência acabam sendo mulheres. Quando comecei a escrever eu pensei em falar sobre essas mulheres que eu gostaria de eternizar em palavras. Para minhas avós, para minha mãe, minhas avós não puderam ler, já eram falecidas, mas para todas as outras eu consegui mostrar os textos. Algumas me ensinaram a ter uma sensibilidade artística maior, outra me ensinou a como ver a vida de uma forma bem mais livre que eu não sou capaz. Minha intenção é mostrar essa atenção que eu recebi delas”, disse Adrianna.
Para a professora Josiane Francisco, a pandemia foi acordar de um longo período de silêncio em relação à escrita literária. “Fiquei 20 anos sem escrever. Foi de grande reflexão para mim este momento, tentei resgatar aquela menina que escrevia. Teve um período em que não tínhamos perspectiva nenhuma do que ia acontecer conosco. Eu falei: ‘acho que está na hora de resgatar a escrita porque não sei quanto tempo tenho de vida’. Quis acordar os projetos engavetados”.
“Meu livro ‘Vozes em Mim’ foi inspirado em mulheres reais. Trazer histórias comuns, de mulheres comuns, mas com um encantamento, era o que eu queria. Fiz uma releitura da personagem bíblica Judite. Deu uma pitada de magia para essas mulheres comuns. Elas tiveram coragem, tiveram um ápice, mas no final voltaram à condição de dona de casa, de mãe, e não tiveram seu reconhecimento. Escrever é uma forma de homenagear essas mulheres”.
“A minha avó era uma analfabeta, mas era uma excelente contadora de histórias. Era fascinante, ela mexia muito com meu imaginário. Eu quis, sim, resgatar esses causos. As histórias, os causos têm essa magia. Eu quis homenagear a Mitiko, minha primeira amiga da faculdade, numa história, também”, explica Josiane.
A escritora Diana Pilatti fez a si mesma uma promessa antes da pandemia, no seu aniversário de 40 anos. “Eu me perguntava o que me deixou de ser eu mesma, o que se quebrou. Aí eu fiz a promessa de escrever. Por mais que eu me preocupasse, a tristeza, o medo, ainda sim eu tinha aquele momento de alegria, lendo, estudando, buscando eu mesma. A escrita foi meu bote salva-vidas. O meu livro ‘Haicais e outros poemínimos’ tem a ver com o estilo do texto, de observação. Esse observar pela janela tem a ver com esse texto mais curto, o haicai é algo contemplativo, é olhar para o mundo e se ver ali. Gosto de trabalhar a reflexão sobre o mundo, sobre mim e como o mundo me influencia. É uma pitada de solidão que tem no escrever”.
“Escrever com poucas palavras é um desafio constante, é um exercício. Às vezes eu faço textão, e eu vou enxugando esse texto até ele chegar no tamanho que eu quero. E também busco palavras que tenham multiplicidade de sentidos. O texto pequeno acaba sendo grande por isso. Tudo que a gente olha nos remete à nossa história, a nós mesmos. Aquele jogo de palavras que dá a possibilidade de uma dupla leitura, aí o leitor viaja no texto”, finaliza Diana.
Fotos: Daniel Reino