Segundo dia da FLIB trouxe debates importantes sobre prosa, poesia, biografia e inclusão

  • Publicado em 19 set 2025 • por Karina Medeiros de Lima •

  • A Feira Literária de Bonito (FLIB) chega à sua nona edição entre os dias 17 e 21 de setembro, na Praça da Liberdade. Neste segundo dia de Feira, foi realizado no período da tarde o Circuito Literário, conversas com escritores renomados de Mato Grosso do Sul e do Brasil.

    Às 15 horas aconteceu o Dedo de rosa sobre “Poesia” com Elias Borges, Carlos Amarilha, Silvio Santanna de Souza e Wanderson Fonseca. Um dos participantes, o escritor e professor Elias Borges, disse que, enquanto professor, uma das primeiras coisas que ele procura observar dentro da sala de aula é qual aluno está com algum livro em cima da carteira. “E geralmente tem, né? E a maioria estão lá com livros de autores estrangeiros, essa coisa toda. Então, para mim, aquilo é uma tremenda provocação, no bom sentido. Eu fico extremamente apaixonado de ver que ainda tem estudantes com vontade de ler. A gente vê concretizado, né? É exatamente o que nós temos, escritores, tem gente produzindo literatura. E uma coisa maravilhosa são os fundos de incentivo que a gente tem, né? Esse meu livro mesmo, Monograma de Amor, é um incentivo do FIC”.

    Outro participante, o escritor Carlos Amarilha, morador de Dourados, disse que em seu município existe um grupo, o Grupo Literário Arandu, que significa Amor à Sabedoria, que existe há 28 anos, que foi montado para não ficar dependendo das grandes editoras e que os escritores pudessem ter um canal de divulgação de suas obras. “E nós temos um núcleo de estudo das identidades culturais sul-mato-grossenses, onde a gente vai estar descongelando ícones de pertencimento das identidades culturais sul-mato-grossenses. Mato Grosso do Sul tem um rosto, Mato Grosso do Sul tem uma cara, Mato Grosso do Sul tem cores, Mato Grosso do Sul tem gostos, comidas, e aí nós enquanto escritores, moradores nesse estado, nós, uma galera, né, de quatro, cinco escritores, então nos nossos livros a gente descongela os ícones de pertencimento de Mato Grosso do Sul. Então nos nossos poemas, nas nossas crônicas, nos nossos romances, você vai ter a Sopa Paraguai, o Tereré, os rios de Mato Grosso do Sul, que ela não é só o Pantanal, mas ela também é o Paraná, então o Mato Grosso do Sul, ela tem esse lado Paraná muito forte, e esses escritores, então, ali da Arandu, a gente tem, então a gente vai cantar o rio Ivinhema, o rio Brilhante, o rio Vacaria, o rio Dourados, também o rio Paraguai, mas com uma forma de poder divulgar, né, os ícones de pertencimento dessa região sul de Mato Grosso do Sul”.

    Às 16 horas aconteceu uma conversa com a escritora, roteirista, dramaturga e radialista Keka Reis, que falou um pouco de seus livros e de suas personagens e sobre a importância da leitura na adolescência. “Leitura é formação, leitura é dar um instrumento de viagem, leitura é dar um instrumento de… eu acho que os adolescentes hoje, eu falo isso sempre com muita pena no coração, os adolescentes estão com os dois pés na realidade de um jeito que não é saudável pra eles. Os adolescentes têm que poder sonhar e a gente tá quase matando o sonho pra eles, assim, e a literatura é sonho também, a literatura é um instrumento pra esse tipo de coisa, então é formação, acho importantíssimo. Eu comecei a trabalhar pra esse público na literatura um pouco de um jeito que quase todos os autores começam, que é com criança pequena em casa e eu comecei a escrever audiovisual pra criança quando eu tinha criança pequena em casa. Porque eu estava totalmente naquele mundo e era um mundo que eu estava habitando ali então ficou fácil pra mim. Acho que essa foi a minha ponte, escrever para o público infanto-juvenil tem uma coisa muito mais interessante que é essa liberdade, sabe? É um pacto mais suave que você faz com o leitor, porque é um leitor ainda menos cínico, é um leitor ainda que tudo pode, que permite então se tem ali uma capacidade de voar”.

    Logo depois, às 17 horas, aconteceu um Dedo de Prosa com os escritores Febraro de Oliveira, Maria Carol e Idayane Jacques. Febraro de Oliveira falou um pouco sobre a sua livraria, a Hámor: “A gente só expõe os livros que a gente gostaria de ler. E isso tem dois movimentos, o movimento egóico, escolhendo os livros por afinidade, mas também existe o movimento de pensar a livraria como um espaço de convivência. E para pensa-la como um espaço de convivência a gente tem que ter uma afinidade muito grande com os livros que estão sendo expostos, e isso faz com que a livraria não aceite pegar livros best sellers, não é o que interessa à livraria, mesmo sabendo que isso dá prejuízo financeiro, mesmo sabendo que isso faz com que as contas da livraria fiquem sempre no limite. Nos interessa olhar o que está sendo publicado no Brasil e fora do Brasil também e pensar, desses autores que estão publicando coisas novas, quais deles estão preocupados em abrir fendas nos espaços. Foi o que a gente falou um pouco hoje da FLIB, que corpos LGBTQIAPN+, corpos com deficiência, corpos negros, indígenas, ocuparem mais espaço, não é sobre isso, é sobre criar fendas, projetos de continuidade, é pensar como esses corpos continuam ocupando esses espaços mesmo quando a gente entra num movimento como a gente está agora de extrema direita reocupando e rearticulando as narrativas. Então isso para mim interessa mais pensar essa construção de um projeto de continuidade como a gente vê na FLIB do que ações pontuais, porque não cria fenda, cria ocupação de espaços, e isso não interessa na livraria, pelo que eu vejo não interessa à FLIB também”.

    A escritora Maria Carol falou sobre o seu processo de “escrevivência”, que conheceu a partir da obra da Conceição Evaristo: “Eu conheci a Conceição Evaristo, primeiramente eu li Olhos d’Água, e depois eu fui pesquisando mais sobre ela, entendendo como que ela entendia a literatura que ela fazia, e cheguei até a escrevivência, que é esse termo que ela criou enquanto estava no mestrado, para falar sobre essa escrita que dá espaço para a nossa existência enquanto pessoas negras. Então é essa escrita que vai nos humanizar, porque muitas vezes pessoas negras não têm esse espaço de serem publicadas, por exemplo. Felizmente as coisas estão caminhando, mas ainda são espaços aversivos para a gente. Às vezes quase inalcançáveis, enfim. E as nossas narrativas, elas nem sempre são contempladas, são respeitadas. Há uma série de estereótipos quando vamos ver pessoas negras nos livros, por exemplo. Então a conceição, ela vem com esse movimento de ir retomada mesmo, de falar sobre a importância da nossa autonomia, a importância da gente se colocar como corpo, como presença, da gente trazer a oralidade, da importância dessas histórias que muitas vezes são invisíveis, que muitas vezes são deslegitimadas”.

    Às 19 horas foi a vez de Gustavo de Castro falar sobre “Escrever biografias: confrontar alteridades”. Para Gustavo, que já biografou Manuel de Barros, Italo Calvino, Francisco Ayala, Guimarães Rosa e agora está escrevendo sobre Edgar Morin, a pesquisa biográfica é uma pesquisa apaixonada, “você tem que estar apaixonado pelo personagem, ou odiar muito o personagem, não é o meu caso, o meu caso é de paixão mesmo. Então, a partir dessa paixão a gente vai criando, fazendo uma pesquisa que demora, geralmente demora 4 a 5 anos a fazer essa pesquisa. E é essa paixão que me leva exatamente a produzir a obra no final. A pessoa do Manuel, é uma pessoa encantadora, é um homem muito interessante, um homem apaixonante, um homem lindo, tem uma produção poética muito sensível e delicada, acho que merece ser estimulado, ser conhecido”.

    Texto: Karina Lima

    Fotos: Elis Regina e Luana Chadid

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    Feira Literária de Bonito

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