Campo Grande (MS) – Aconteceu na manhã desta segunda-feira (18), na sala da Assessoria de Projetos da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul, a Oficina de Gestão Cultural e Elaboração de Projetos Culturais, ministrada por André Fonseca, consultor e pesquisador independente em gestão cultural, de São Paulo, e diretor da Projecta.
A Oficina faz parte da Semana Pra Dança 2015, e está dividida em duas partes, sendo a primeira realizada hoje de manhã e com continuação no período da tarde. Esta primeira parte trata da Gestão cultural no contexto da dança; de expectadores a cocriadores: (re)pensando a relação com os públicos; novos modelos de produção e gestão de projetos e ações culturais.
A secretária adjunta da Secretaria de Cultura, Turismo, Empreendedorismo e Inovação (Sectei), Andréa Freire, participou da primeira parte dos trabalhos. “É uma satisfação promover esta oficina com este tema importante, pois ajuda o artista a organizar aquilo que ele já sabe fazer mas que precisa ordenar o pensamento para concretizar as atividades. Espero que dialoguem conosco para que possamos avançar nos caminhos do desenvolvimento da nossa cultura”.
O consultor paulista André Fonseca afirmou ser importante num evento como a Semana Pra Dança as discussões sobre o Plano Setorial. “É necessário contemplar a parte artística, de profissionalização e planos de gestão em eventos como este”.
Foram iniciados os trabalhos com discussões sobre as relações entre públicos e cultura na era digital. André explica que o processo de produção – distribuição – consumo foi alterado com as mídias digitais. “Hoje em dia qualquer pessoa virou produtora de conteúdo. O público começa a querer participar, não mais ser um consumidor passivo.
Foi abordado o fenômeno contemporâneo das selfies, um problema em vários museus e instituições culturais no mundo inteiro. “Na Europa museus se reúnem para discutir a questão, essa nova forma de absorver cultura. Isso gera outras discussões sobre a proibição da frequência desse público. Existe um modo correto de fruir cultura?”, questiona o consultor.
Andréa Freire intervém dizendo que este hábito é relevador de um pensamento moderno. “As pessoas absorvem um conteúdo que não é só para elas; as pessoas têm necessidade de pôr para fora, compartilhar. É necessário discutir o que é a instantaneidade e como processar isso para criar conteúdo”.
O ministrante diz que esta é uma mudança de hábito muito forte do consumo cultural. Trata-se de um choque geracional, um hábito que vem forte e não se tem controle sobre ele. São processos de sociedades, são mutáveis. “Talvez sejam necessários dias específicos para se permitir selfies, para atender diferentes tipos de público nos museus. A selfie é publicidade gratuita. Monitores em alguns museus, como no Tomie Ohtake, em São Paulo, incentivam selfies para postagens em mídias sociais como forma de atrair frequentadores”.
Foi citado o exemplo da Nashville Opera, nos Estados Unidos, que reserva acentos, os Tweet Seats, em que é permitido usar celulares para mídias sociais, tweeter. “O objetivo é rejuvenescer o público de ópera, pois as postagens incentivam os amigos a ir às apresentações”, afirma André.
Ele cita também o caso que aconteceu na Estação Pinacoteca, em São Paulo, em que um visitante foi proibido de tirar fotos numa determinada sala. “Ele reclamou dizendo que o monitor tirou dele a diversão quando o proibiu de tirar fotos. Hoje em dia tudo precisa da mediação de um dispositivo digital”.
Marcos Mattos, da Cia Dançurbana e membro da Comissão da Sociedade Civil para a criação do Plano Setorial da Dança, intervém dizendo que há perda na fruição da arte quando se preocupa muito com o uso desses dispositivos. O consultor André Fonseca afirma que há perdas e ganhos e que hoje o público se comporta de outro modo.
André fala sobre um vídeo da Nationale Opera & Ballet, na Holanda, em que é mostrado muito pouco dos espetáculos. O vídeo apresenta as pessoas entrando no teatro, na plateia, conversando no café, conhecendo a localidade. “Esses são fluxos de experiências acopladas ao espetáculo”.
Para ele, estabelecer relações com o público implica: pré-disposição ao diálogo; conhecer o perfil do público que se quer atingir; encontrar os pontos comuns de interesse (do gestor e do público); cultuvar as relações; facilitar as informações; oferta cultural relevante (achar um perfil de público que se interesse pelo que o artista ou gestor tem a ofertar) e gerar percepção de valor.
Durante a oficina foram apresentadas pesquisas realizadas no país sobre o consumo cultural. O Ministério da Cultura, com a pesquisa Cultura nos Municípios, divulgou que cerca de 55% dos municípios brasileiros têm grupos de dança. É a segunda manifestação cultural mais apresente no Brasil, só perde para o artesanato.
Segundo a pesquisa “Percepção Social da Cultura, realizada em 2010, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as pessoas entendem que a cultura não é atividade de lazer. O Panorama Setorial da Cultura Brasileira, de 2013-2014, relata que os brasileiros entendem que cultura é só aquilo que é erudito, que não é acessível. Os benefícios esperados de uma oferta cultural são: ser divertida; provocar fortes emoções e ser uma atividade familiar.
André elenca algumas tendências atuais na elaboração de projetos culturais:
• Cultura como bem comum e pertencente a todos;
• Valorização da inteligência coletiva (absorver dentro dos projetos o conhecimento coletivo);
• Agentes culturais como dispositivos abertos (compartilhar conhecimentos);
• Produção cultural reposicionada num contexto mais amplo que o do mercado.
Dentro dessas novas tendências ele citou o exemplo do SP Cultura, da Secretaria de Cultura de São Paulo, que realizou um mapeamento cultural da cidade, com agentes culturais, espaços e projetos. Ele citou também o Walking Gallery, que é uma galeria itinerante em que os artistas saem nas ruas com suas pinturas, expondo e comercializando suas obras em estações de metrô. O último aconteceu no bairro do Bexiga, em São Paulo. Há também o exemplo do Núcleo do Dirceu, de Teresina, no Piauí, projeto com apoio da Petrobrás cujo objetivo é levar dança contemporânea para mil casas da região.
“Esses projetos têm esses conceitos: remixagem (construir novas ideias em cima de ideias de outros); inteligência coletiva, redes, arquivos novos, compartilhamento, conhecimento coletivo, laboratório, novos circuitos de operação”.
A primeira parte da Oficina de Elaboração de Projetos continua no período da tarde, a partir das 14 horas. Mais informações no Núcleo de Dança da FCMS pelo telefone (67) 3316-9169.