Corumbá (MS) – No campo da literatura latino-americana nesta 16º edição do Festival América do Sul Pantanal, o Quebra-Torto com Letras teve, na manhã deste sábado (28.05) o prazer de contar com a presença de grandes escritores que em seus textos revelam a natureza humana latino-americana: Carla Maliandi (Argentina), Santiago Nazarian (Brasil/São Paulo) e Márcia Medeiros (Brasil/Mato Grosso do Sul), com a mediação de Wellington Furtado Ramos.
Carla Maliandi veio da prática teatral, mas logo depois migrou para a literatura. “Eu venho da prática teatral, quando fazia o estudo secundário na escola mas foi uma carreira frustrada, eu me inscrevi no conservatório de arte dramática pensando que queria ser atriz porque eu gostava muito de teatro. Logo ensaiando e vendo as cenas de meus colegas do conservatório, percebi que me interessava muito mais pelos textos. Até que um dia me dei conta de que o que eu mais gostava era escrever. Começaram a me pedir textos, obras, e aí percebi que eu era uma dramaturga, e não uma atriz”.
“O teatro é maravilhoso, eu gosto muito, mas está muito limitado às condições de produção, pelo menos o teatro que eu queria. Então me vi escrevendo narrativas, o personagem pode fazer qualquer coisa, pode viajar, pode voltar, sair voando. Nunca pensei neste período da escrita que foi muito feliz, eu estava triste, mas a companhia da escrita e o processo de escrever me fez muito feliz. Nunca pense no leitor, nunca pensei na publicação. Adiei muito este momento e escrevia pelo mero direito de meter-me neste mundo, provar, rir, buscar uma forma, sem ter um plano. Este processo de escrita é muito grato. Estar aqui hoje é realmente incrível”.
Santiago Nazarian (esq.), Carla Maliandi (dir.)
O bem-humorado Santiago Nazarian, escritor de São Paulo, esclareceu que ele é o típico escritor que começou a publicar no começo do milênio, aos 20 anos, com um pouco mais que vinte anos. “O período do início dos anos 2000 foi um período muito promissor para a literatura brasileira, continha essa leva de jovens escritores na qual eu me incluo. Na época a internet era principalmente escrita, não tinha toda essa tecnologia de áudio que a internet tem hoje, então os youtubers daquela época eram blogueiros. Foi uma época muito bacana para a literatura, para a cultura do Brasil como um todo. Todos os festivais que traziam música, literatura, começaram nesse começo de milênio. É minha missão como escritor trazer temas diferentes, estéticas diferentes para a literatura”.
Marcia Medeiros, de Mato Grosso do Sul, trabalha com uma perspectiva de literatura um pouco diferente. “Meus livros são basicamente livros de fantasia, eu trabalho com um universo onde eu discuto e trago elementos mágicos como magos, vampiros, lobisomens, interagindo no sentido de tentar buscar um equilíbrio para a natureza, para o mundo, dentro de uma perspectiva que a gente até poderia dizer sustentável, equilibrar e equalizar as forças que estão aí no movimento na Terra. E recentemente eu publiquei um conto que fala sobre as questões indígenas, para discutir um pouco os processos de expropriação, de violência que as comunidades tradicionais dos povos indígenas têm enfrentado. Então a minha base de trabalho é essa: eu misturo alguns elementos de fantasia, num universo que está representado em todas as culturas por esses seres mágicos e míticos que procuram aí um equilíbrio da natureza, e tenho trabalho também algumas questões relativas aos povos indígenas, ao racismo, que é um trabalho ao qual eu tenho me dedicado mais recentemente, é um projeto novo que está saindo aí”.
“A literatura é um instrumento mágico, a literatura ela propicia para as pessoas o conhecimento maior de si mesmo e o conhecimento maior do mundo. O Roland Barthes, que é um teórico da literatura que eu gosto muito, ele fala uma frase que diz assim: a literatura sabe um pouco sobre tudo e muito sobre o ser humano. Então quando a gente está participando de um evento desses e tem a oportunidade de trocar com o público, de trocar com outros escritores, com outras escritoras, com as pessoas que organizam um evento tão maravilhoso, a gente tem a possibilidade de plantar várias sementinhas para que no futuro a gente tenha uma geração de leitores, de leitoras, de pessoas com uma consciência crítica, principalmente capazes de entender algumas questões básicas relacionadas à solidariedade, empatia e ao respeito à diversidade”.
Márcia disse que, num primeiro momento, ficou surpresa por ter sido convidada para o Quebra-Torto com Letras no Festival. “A gente nunca espera que vai estar num evento tão grandioso como esse, representando o Estado de Mato Grosso do Sul junto com autores e autoras de toda a América Latina, de renome nacional e internacional. Então para mim foi um grande privilégio, uma honra fazer parte deste evento e estar aqui hoje e falar um pouco sobre o trabalho de literatura que é feito em Mato Grosso do Sul”.
A professora Susylene Araújo (UEMS) teve a oportunidade de falar um pouco do seu projeto a respeito de Lobivar de Matos. “Eu estou muito feliz, muito emocionada por poder falar nesse quebra-torto. O Festival deste ano faz homenagem ao Modernismo, que não ficou circunscrito a Rio – São Paulo, que tem extensão aqui pro Centro-Oeste, na obra da Lídia e na obra do Lobivar. Eu venho fazendo esse estudo sobre o Lobivar desde 1999, é um estudo que a cada ano vai me provocando a colocar as obras e circulação. Há dez dias eu entreguei os textos para a editora mas a impressão não foi possível, então eu estou aqui me comprometendo a daqui um mês, no São João, fazer o lançamento desse projeto, que seria a coleção Lobivar Matos, reunindo “Arôotorare”, “Sarobá”, um livro inédito de contos e um livro com textos que ele publicou em jornais. Então vocês aguardem essa coleção com as capas dos originais reproduzidas numa releitura feita pela Marlene Mourão, a Peninha”.
Encantada, na plateia, estava a professora de Corumbá e pedagoga Andréa Duarte de Oliveira, que comprou vários livros que estavam sendo vendidos no Quebra-Torto com Letras. “Meu interesse pelo Quebra-Torto foi pelo meu interesse pela leitura. E isso sempre foi desde a minha infância. Desde quando eu me lembro eu pedindo para o meu pai comprar livro e o pai sempre tentando comprar livro para mim. Comprei dois livros de literatura infantil, que é para eu utilizar no meu trabalho, ‘A guerreira Potira’, da Bianca Rezende, ‘Um gato no Jardim’, da Tânia Souza, ‘O voo da Guará Vermelha’, da Maria Valéria Rezende. ‘Meu país é um corpo que dói’ eu comprei por causa do título, porque o Brasil está doendo hoje em dia, da Claudete Daflon; ‘Estranhas Delicadezas’, da Tânia Souza, eu o vi porque eu passei o olho nos pontos e me pareceu uma leitura fácil, rápida, como o mundo está meio complicado e você está meio sem tempo para ler, então são livros de pequenos textos, ensaios, contos, dá para ler. Um dia eu leio um, depois eu leio outro. E mais um livro da Carla Maliandi, ‘La Estirpe’, porque eu preciso aprender um pouco mais e pelo ensaio que tem aqui, parece bem interessante porque, pelo que ela está falando também, parece um pouco a história de uma família que se transporta para outro país, que não é o seu país de origem e tem a sua história contada neste livro desse processo. Parece interessante a história e eu tenho, de certa forma, que me obrigar a ler em espanhol. Por isso eu comprei esses livros”.
Fotos: Alvaro Herculano