Campo Grande (MS) – Na tarde deste sábado (09.03), pessoas de várias “tribos” e idades se reuniram para participar de uma programação em homenagem às mulheres no Museu da Imagem e do Som. Às 14 horas foi realizada a oficina de bonecas Abayomi, às 16 horas foi exibido o filme “Glauces, Estudo de um Rosto”, de Joel Pizzini, e logo depois, foi aberta a exposição com fotos e figurinos retratando a vida e carreira da atriz Glauce Rocha.
A oficina de bonecas Abayomi foi ministrada pela feminista negra Angela Vanessa Epifânia, bacharel em Serviço Social e membro do Coletivo de Mulheres Negras de MS “Raimunda Luzia de Brito” (Cmnegras). Angela explica que, para acalentar seus filhos durante as terríveis viagens a bordo dos navios tumbeiros – navios de pequeno porte que realizavam o transporte de pessoas escravizadas, as mães africanas rasgavam retalhos de suas saias e a partir deles criavam pequenas bonecas, feitas de tranças ou nós, que serviam como amuleto de proteção.
“As bonecas, símbolo de resistência, ficaram conhecidas como Abayomi, termo que significa ‘encontro precioso’, em Iorubá, uma das maiores etnias do continente africano, cuja população habita parte da Nigéria, Benin, Togo e Costa do Marfim. As bonecas são símbolo de resistência e de afirmação das raízes da cultura afro-brasileira e também do poder e determinação das mulheres negras. As bonecas não possuem demarcação de olho, nariz nem boca, para favorecer o reconhecimento das múltiplas etnias africanas”.
A pedagoga Luana Benites, 36, trouxe sua filha Isna, de 9 anos, para participar da oficina. Luana é professora em uma escola municipal de educação infantil e pretende levar o conhecimento adquiridos para seus alunos, que estão na faixa etária de 4 a 5 anos. “Tenho muita preocupação em passar para as crianças a cultura negra. Procuro me aperfeiçoar como professora e acabo fazendo, também, como mãe. Sempre que posso levar meus filhos nos eventos, eu levo. Essa boneca representa essa vivência das diferenças, do respeito às diferenças”.
Henrique Minante, que trabalha num ateliê de moda e é cuidador social num abrigo da prefeitura, veio a convite de sua colega da Universidade, Rafaela de Oliveira. Ambos são graduados em Artes Cênicas pela UEMS. “Eu gosto de fazer oficinas que aparecem no meio das artes, gosto deste trabalho artesanal. Isso foi um conhecimento novo pra mim, de as bonecas servirem para acalmar as crianças no navio. A minha eu vou guardar, mas pretendo fazer outra pra presentear uma amiga. Pretendo transmitir para os internos do abrigo esta atividade, e quando for trabalhar como docente, passar para meus alunos”.
Rafaela, que já deu aulas na educação infantil, explica que estes assuntos não são muito tratados na escola. “É necessário passar pras crianças nossa história, é importante se reconhecer naquilo que está sendo contado. É para refletir e levar isso como forma de aprendizado, trazendo a luta dessas mulheres, que ressignificaram a própria vida e a dos seus filhos, levando alento e sobrevivência. A minha boneca eu vou dar pra minha mãe, que representa para mim muita luta, muita fibra”.
Para Mara Caseiro, diretora-presidente da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul, este é um momento de encontro, de troca de experiências e também de aprender uma atividade nova. “É importante oportunizar às pessoas de aprender, de conhecer um pouco da história das pessoas escravizadas que vieram para o Brasil. Com criatividade e superação, essas mulheres enfrentaram a dor e conseguiram se reinventar, trazer um pouco de alegria para os filhos”.
Logo após o término da oficina foi exibido o curta-metragem “Glauces, Estudo de um Rosto”, do cineasta Joel Pizzini. O curta foi lançado em 2001 e navega pela grandiosa obra da atriz. Utilizando trechos de filmes com imagens da artista, o diretor se expressa na linguagem poética pela voz de Paulo Autran. Ganhou diversos prêmios, entre eles o prêmio de Melhor Curta Metragem no Festival de Brasília em 2002, Melhor Linguagem no Cinevitória em 2002 e Melhor Montagem no Festival de Recife em 2002.
Após a exibição, foi aberta ao público a exposição “Glauce Rocha, atriz brasileira”, que traz parte do acervo doado pela família da atriz. São dezenas de fotos de Glauce em diversos momentos de sua vida, imagens de peças utilizadas em suas atuações no teatro, na televisão e no cinema, além de livros, jornais, documentários, discos e figurinos que contam a trajetória profissional e um pouco da vida pessoal desta campo-grandense que se tornou uma das maiores atrizes do Brasil.
“A gente traz a Glauce Rocha para esta exposição, que é um grande exemplo, um ícone do cinema, uma grande mulher que revolucionou sua época. Também foi uma mulher que superou os obstáculos para ser o que ela queria ser, conseguiu superar o machismo e os preconceitos e se tornou uma grande mulher para a cultura do Estado e do País. Mostrar o trabalho dela é estimular outras mulheres a buscar seus espaços e realizar seus sonhos”, diz Mara Caseiro.
Quem quiser conhecer um pouco mais da vida da atriz está convidado a visitar a exposição, que fica aberta ao público até o fim de abril, no Museu da Imagem e do Som (3º andar do Memorial da Cultura e Cidadania – avenida Fernando Corrêa da Costa, 559). O horário de visitação é das 7h30 às 17h30.
Fotos: Daniel Reino